domingo, 27 de janeiro de 2008

Anos Incríveis


Domingo revendo Anos Incríveis.
Pena que a nova geração praticamente desconhece essa torta de morango!
Anos Incríveis (em inglês, The Wonder Years) foi uma série americana de televisão criada por Carol Black e Neal Marlens. Durou seis temporadas na rede americana ABC, de 1988 a 1993. No Brasil, o programa já foi exibido pela TV Cultura, TV Bandeirantes, Multishow e Rede 21, até voltar à TV Cultura.
A abertura já é um show à parte, embalada pela versão de Joe Cocker da música dos Beatles With a Little Help from My Friends, que, inclusive, postei recentemente. A história? Trata da vida de um jovem chamado Kevin Arnold, que vive os dilemas próprios da infância e da adolescência: a primeira namorada, os amigos do peito, a professora linda (pela qual, invariavelmente, todos nós nos apaixonamos um dia), os problemas com os pais, o irmão mala, a irmã hippie, as desilusões, as pessoas que marcam nossa nossa vida e se vão... essa nossa busca por entender o amor e a morte. A vida, enfim. Tudo isso tendo, como pano de fundo, as tensões sociais e os eventos históricos do final dos anos 60 e início dos anos 70.
São temas universais com quais nos identificamos, não importa em que época vivamos. O homem apenas mudou a maneira de se vestir ou de falar, inventou formas de prolongar vida ou acelerar a morte, mas, em geral, continuamos a amar da mesma forma, a odiar da mesma forma. São as mesmas dúvidas, os mesmos sonhos, as mesmas esperanças.
Acho que o grande tema da série é, sobretudo, o da morte. Não o da morte física, embora isso esteja presente também. Ela não se resume ao “fim da vida”, a uma parada mais ou menos brutal da nossa existência. Edgar Allan Poe, num dos seus mais famosos poemas, encarna essa idéia da irreversibilidade do curso da existência num animal sinistro, um corvo empoleirado na beira de uma janela, que só sabe dizer e repetir uma única fórmula: Never more – “nunca mais”.
Poe quer dizer que a morte designa em geral tudo o que pertence à ordem do “nunca mais”. Ela é, no cerne mesmo da vida, o que não voltará mais, o que pertence irreversivelmente ao passado, e que nunca mais poderemos reencontrar. Podem ser as férias da infância, passadas em lugares e com amigos de quem nos afastamos sem possibilidade de volta, o divórcio dos pais, as casas ou as escolas que uma mudança nos obriga a abandonar, e mil outras coisas: mesmo que não se trate sempre do desaparecimento de um ser querido, tudo o que é da ordem do “nunca mais” pertence ao registro da morte. Restam apenas lembranças. E é assim que Anos Incríveis nos ganha. Todos nós vivemos em meio a essas "pequenas mortes diárias" e as relembramos ao longo do nosso caminho, com doçura ou amargor. São elas que nos definem, que dizem quem somos.
Por isso o delicioso tom nostálgico e lírico que encontramos no seriado. Enquanto se passam as histórias, os acontecimentos são narrados em off por um Kevin mais velho e experiente, que descreve o que acontece e conta o que aprendeu de suas experiências. O roteiro, aliás, nunca cai em soluções fáceis e simplistas. O interessante é que as histórias são bem anticlimáticas: quando o protagonista se vê em alguma enrascada, você pode ter certeza de que não acontecerá nenhum milagre para salvá-lo e, se ele tem a chance de consertar as coisas, pode ter certeza de que ele estragará tudo. Somos assim. A vida é assim. Erramos, machucamos, mas somos eternas crianças, tentando aprender.
Já os finais são, geralmente, melancólicos. Mas plenos de poesia. Como o narrador diz no último episódio:

Crescer é algo muito rápido. Um dia você usa fraldas e no outro você vai embora. Mas as memórias da infância permanecem com você. Lembro-me de um lugar, uma cidade, uma casa como várias outras casas, um quintal como vários outros quintais, em uma rua como várias outras ruas. E o fato é que, após todos estes anos, eu ainda olho para trás: foram anos incríveis.

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