sexta-feira, 27 de junho de 2008

Amores silenciosos

CONTARDO CALLIGARIS



A gente se declara apaixonado porque está apaixonado ou pelo prazer de se apaixonar?

FAZER E RECEBER declarações de amor é quase sempre prazeroso. O mesmo vale, aliás, para todos os sentimentos: mesmo quando dizemos a alguém, olho no olho, "Eu te odeio", o medo da brutalidade de nossas palavras não exclui uma forma selvagem de prazer.
De fato, há um prazer na própria intensidade dos sentimentos; por isso, desconfio um pouco das palavras com as quais os manifestamos. Tomando o exemplo do amor, nunca sei se a gente se declara apaixonado porque, de fato, ama ou, então, diz que está apaixonado pelo prazer de se apaixonar.
Simplificando, há duas grandes categorias de expressões: constatativas e performativas.
Se digo "Está chovendo", a frase pode ser verdadeira se estamos num dia de chuva ou falsa se faz sol; de qualquer forma, mentindo ou não, é uma frase que descreve, constata um fato que não depende dela.
Se digo "Eu declaro a guerra", minha declaração será legítima se eu for imperador ou será um capricho da imaginação se eu for simples cidadão; de qualquer forma, capricho ou não, é uma frase que não constata, mas produz (ou quer produzir) um fato. Se eu tiver a autoridade necessária, a guerra estará declarada porque eu disse que declarei a guerra. Minha "performance" discursiva é o próprio acontecimento do qual se trata (a declaração de guerra).
Pois bem, nunca sei se as declarações de amor são constatativas ("Digo que amo porque constato que amo") ou performativas ("Aca- bo amando à força de dizer que amo"). E isso se aplica à maioria dos sentimentos.
Recentemente, uma jovem, por quem tenho estima e carinho, confiava-me sua dor pela separação que ela estava vivendo. Ao escutá-la, eu pensava que expressar seus sentimentos devia ser, para ela, um alívio, mas que, de uma certa forma, seria melhor se ela não falasse. Por quê?
Justamente, era como se a falta do namorado (de quem ela tinha se separado por várias e boas razões), a sensação de perda etc. fossem intensificadas por suas palavras, e talvez mais que intensificadas: produzidas.
É uma experiência comum: externamos nossos sentimentos para vivê-los mais intensamente -para encontrar as lágrimas que, sem isso, não jorrariam ou a alegria que talvez, sem isso, fosse menor. Nada contra: sou a favor da intensidade das experiências, mesmo das dolorosas. Mas há dois problemas.
O primeiro é que o entusiasmo com o qual expressamos nossos sentimentos pode simplificá-los. Ao declarar meu amor, por exemplo, esqueço conflitos e nuances. No entusiasmo do "te amo", deixo de lado complementos incômodos ("Te amo, assim como amo outras e outros" ou "Te amo, aqui, agora, só sob este céu") e adversativas que atrapalhariam a declaração com o peso do passado ou a urgência de sonhos nos quais o amor que declaro não se enquadra.
O segundo problema é que nossa verborragia amorosa atropela o outro. A complexidade de seus sentimentos se perde na simplificação dos nossos, e sua resposta ("Também te amo"), de repente, não vale mais nada ("Eu disse primeiro").
Por isso, no fundo, meu ideal de relação amorosa é silencioso, contido, pudico.
Para contrabalançar os romances e filmes em que o amor triunfa ao ser dito e redito, como um performativo que inventa e força o sentimento, sugiro dois extraordinários romances breves, de Alessandro Baricco, o escritor italiano que estará na Festa Literária Internacional de Parati, na próxima semana: "Seda" e "Sem Sangue" (ambos Companhia das Letras).
Nos dois, a intensidade do amor se impõe com uma extrema economia de palavras ("Sem Sangue") ou sem palavra nenhuma ("Seda"). Nos dois, o silêncio permite que o amor vingue -apesar de ele não poder ser dito ou talvez por isso mesmo.
No caso de "Seda": te amo em silêncio porque te encontro ao limite extremo de uma viagem ao fim do mundo, indissociavelmente ligada a um outro, e nem sei falar tua língua.
Você me ama em silêncio porque sou outro: uma aparição efêmera, uma ave migrante.
No caso de "Sem Sangue": te amo, e não há como falar disso porque te dei e te tirei a vida. E você me ama pelas mesmas razões pelas quais poderia e deveria querer me matar (os leitores entenderão).
Nos dois romances, a ausência da fala amorosa acaba sendo um presente que os amantes se fazem reciprocamente, uma forma extrema (e freqüentemente perdida) de respeito pela complexidade de nossos sentimentos e dos sentimentos do outro que amamos.

sexta-feira, 20 de junho de 2008

No ônibus com Danuza


Voltando de Sampa, nessa semana, peguei pra ler no caminho essa biografia da Danuza Leão. Já havia lido as biografias do Samuel Wainer, do Rubem Braga, do Antônio Maria... Sem contar os livros do Ruy Castro sobre a Bossa Nova e o Rio de Janeiro. Danuza estava em todos! Natural, então, que eu a lesse.
Ela esteve presente em momentos fantásticos da cultura e da política do Brasil e do mundo. Além disso, a prosa dela é bem fluente e envolve. Muito agradável. E seus comentários, como o que segue, são bem saborosos:

Foram quase quatro anos de paixão intensa [sobre a relação com Antônio Maria]. Se fui feliz?
E o que tem isso a ver com a paixão? A paixão faz sofrer, é sombria, trágica, exclui totalmente a felicidade, não é feita para durar e não costuma acabar bem, o que eu não sabia na época; meu pai, sim, sabia, e sabia também que não adiantava me dizer o que previa: que não ia durar. Nessas horas, não adianta ninguém dizer nada, pois os apaixonados são cegos e surdos, e assim sempre serão.


Ode à minha pena esquerda

E por falar em José Paulo Paes, tô preparando umas aulas sobre ele. Seus poemas fazem parte da lista de leituras obrigatórias de dois vestibulares: Ufop e Unifal. O poema mais significativo dele, que o crítico David Arrugucci considera o poema-síntese de toda a sua poética, é a ode "À minha perna esquerda".
Cabe esclarecer: José Paulo tinha aterosclerose. O grave problema circulatório o fez abandonar o cigarro (com o qual ainda sonhava mais de dez anos depois de largar o vício), boa parte das bebidas alcoólicas (restou-lhe o vinho branco, tomado moderadamente), quaisquer extravagâncias alimentares, deslocamentos mais arriscados e esforços físicos. Quem o ajudava era a sua esposa Dora.
Com o agravamento da doença, a circulação prejudicada levou à gangrena de uma das pernas. A perna teve de ser amputada. Da doença ficou esse poema notável:

1

Pernas
para que vos quero?
Se já não tenho
por que dançar,
Se já não pretendo
ir a parte alguma.
Pernas?

2

Desço
.........que .....................subo
................desço...... que
........................subo
........................camas
........................imensas.

Aonde me levas
todas as noites
........pé morto
........pé morto?
Corro, entre fezes
de infância, lençóis
hospitalares, as ruas
de uma cidade que não dorme
e onde vozes barrocas
enchem o ar
de p
.....a
.....i
.....n
.....a sufocante
e o amigo sem corpo
zomba dos amantes
a rolar na relva.

........Por que me deixaste
.............................pé morto
.............................pé morto
........a sangrar no meio
........de tão grande sertão?

..............................não
..............................n ã o
..............................N Ã O !

3

Aqui estou,
Dora, no teu colo,
nu
como no princípio
de tudo.

Me pega
me embala
me protege.
Foste sempre minha mãe
e minha filha
depois de teres sido
(desde o princípio
de tudo) a mulher.

4

Dizem que ontem à noite um inexplicável morcego
....assustou os pacientes da enfermaria geral.

Dizem que hoje de manhã todos os vidros do ambu-
....latório apareceram inexplicavelmente sem tampa,
....os rolos de gaze todos sujos de vermelho.

5

Chegou a hora
de nos despedirmos
um do outro, minha cara
data vermibus
perna esquerda.
A las doce em punto
de la tarde
vão-nos separar
ad eternitatem.
Pudicamente envolta
num trapo de pano
vão te levar
da sala de cirurgia
para algum outro (cemitério
ou lata de lixo
que importa?) lugar
onde ficarás à espera
a seu tempo e hora
do restante de nós.

6

esquerda... direita
esquerda... direita
....................direita
....................direita

...Nenhuma perna
...é eterna.

7

Longe
do corpo
terás
doravante
de caminhar sozinha
até o dia do Juízo.
Não há
pressa
nem o que temer:
haveremos
de oportunamente
te alcançar.

Na pior das hipóteses
se chegares
antes de nós
diante do Juiz
coragem:
não tens culpa
(lembra-te)
de nada.

Os maus passos
quem os deu na vida
foi a arrogância
da cabeça
a afoiteza
das glândulas
a incurável cegueira
do coração.
Os tropeços
deu-os a alma
ignorante dos buracos
da estrada
das armadilhas do mundo.

Mas não te preocupes
que no instante final
estaremos juntos
prontos para a sentença
seja ela qual for
contra nós
lavrada:
as perplexidades
de ainda outro Lugar
ou a inconcebível
paz
do Nada.

O artista e sua obra

Lendo um artigo sobre o poeta José Paulo Paes (1926-1998), na revista Piauí, deparei-me com esse belo trecho:

Não há ilação mais difícil do que aquela que aproxima a biografia e a obra de um autor. Numa passagem comovente, falando de Cézanne, Merleau-Ponty diz que o melhor de um artista deve ser buscado na sua obra. É nela que as incapacidades pessoais de alguma forma se redimem, em que os nossos limites fazem vislumbrar algo maior do que se conseguiu ser, e por isso as obras precisam ganhar a luz do dia. Neuróticos renitentes deixaram trabalhos admiráveis. Cézanne, por exemplo. São os pecadores que entendem de salvação. Não os carolas.
Com freqüência – e quem não viveu essa ilusão deixou de entender a si próprio – tendemos a aproximar, até por generosidade, a grandeza de uma obra ao caráter, igualmente nobre, de seu autor. Do mesmo modo, quem não passou por essa desilusão, por essa discrepância tão corrente, deixou de experimentar uma das dissonâncias mais reveladoras da alma humana.


sexta-feira, 13 de junho de 2008

Solteiro e trintão

Reflexões de um dinossauro heterossexual

"Em algum momento, há 50 milhões de anos, um estegossauro deve ter acordado de uma longa noite de sono e descoberto que o mundo estava em silêncio. Onde estava o brontossauro, seu companheiro de copo? Onde estava o tiranossauro, com quem ele saía para caçar? Onde estava o pterodáctilo, que o havia convidado para jogar bola? Todos haviam desaparecido.
Sinto-me da mesma maneira. Como solteiro, heterossexual e com 30 e poucos anos, estou em extinção. Vi meus companheiros sendo caçados, um por um, como baleias-azuis nas águas do Japão. E essa tragédia não está sendo noticiada. Alguém deveria organizar um show beneficente, ou pelo menos gravar uma música beneficente, para nós, os Spurmos - Straight Proud Unmarried Men Over-30 (Orgulhosos Heterossexuais Solteiros Acima dos 30 Anos, em inglês).
Lembro-me do tempo em que eu e meus amigos vagávamos em manada como búfalos dominando as planícies do oeste americano. Mas nosso bando diminuiu e eu tive de baixar minhas expectativas. Não com as mulheres, mas com os homens. Por necessidade, passei a andar com caras de quem jamais teria sido amigo na universidade. Mas preciso de alguém para sair para beber.
Ao contrário do que se possa imaginar, as esposas dos amigos não são os inimigos dos Spurmos. Nós temos um inimigo diferente: os bebês. Os bebês em si não são um problema. É o que os bebês fazem com seus pais. Um amigo meu era uma lenda das festas. Agora, pai de duas crianças, bebe um copo de chope com soda limonada e anuncia a saída do bar às 9 da noite.
Solteiros heterossexuais acima dos 30 anos fazem do mundo um lugar mais interessante. Temos mais experiência que os de 20. Temos sabedoria, perspectiva e clareza. Por sermos solteiros não falamos de crianças. Só por isso já mereceríamos ser aplaudidos. Sem nós, jantares com os amigos morreriam.
Nossa contribuição para a economia não pode ser esquecida. Como trabalhamos há mais tempo, ganhamos mais e economizamos mais. Como não precisamos gastar nada com crianças damos suporte a muitas indústrias importantes: carros de luxo, champanhe, eletrônicos de última geração, restaurantes românticos e caros.
É um estágio da vida para ser encorajado. Podemos fazer o que quisermos, quando quisermos. Mais importante: lembra-se de todas as lindas mulheres que não lhe davam bola quando você tinha 20 anos? Se elas estiverem solteiras, com seus 30 e poucos anos, o desespero provavelmente terá baixado bastante seu nível de exigência para que você tenha uma boa chance."
Ted Sazan, The Times.

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Indiana Jones


Vamos direto ao assunto: o filme diverte.
Mas é como aquelas comidas requentadas. Saca aquele macarrão que você faz e depois, mais tarde, tenta requentar? Ainda mantém o sabor, mas já não é a mesma coisa. Harrison Ford ainda mantém o carisma, mas muita coisa mudou desde a última aventura de 1989.
A primeira mudança é percebida na direção de Steven Spielberg. Ele não é o mesmo diretor de sucessos como Contados imediatos do terceiro grau, Tubarão ou E.T. A partir dos anos 90, tenho achado que ele perdeu a mão. Nesses dias, revi o Contatos na TV a cabo e foi uma aula de cinema: a maneira como as personagens são desenvolvidas, a preocupação em criar a atmosfera certa, o carinho ao trabalhar a imagem, o roteiro bem costurado, o argumento instigante...
Vemos essa capacidade de encantar, seduzir e lidar com a câmera em poquíssimos momentos dos filmes de Spielberg feitos a partir dos anos 90. Como, por exemplo, nos 10 minutos iniciais d' O resgate do soldado Ryan. O resto era lixo. A partir daí, o diretor norte-americano só demonstra fagulhas da antiga genialidade. A direção é burocrática.
Outra coisa que tenho notado é a mudança na sua personalidade, que fica registrada nesses filmes mais recentes. Ele tem se tornado um conservador. Não sei se "conservador" seria o termo correto. Talvez "puritano". É algo que percebi (e me desagradou) desde o momento em que, ao lançar a versão restaurada de E.T., substituiu, digitalmente, por walk-talkies, as armas dos agentes do governo quando estes realizam o cerco às crianças, próximo ao final do filme. Ridículo. Lembro-me, também, de uma entrevista em que, no lançamento de I.A. - inteligência artificial, Spielberg disse que pretendia fazer um filme que seus filhos pudessem assistir. Desaparecem, portanto, de seus filmes a violência, os conflitos de consciência, as famílias desajustadas - que, se hoje aparecem desajustadas, encontram a redenção no final -, as personagens deliciosamente cínicas ou imperfeitas e, por isso mesmo, mais humanas.
É isso o que notei nesse Indiana Jones e o reino da caveira de cristal. Indiana é apenas um eco do que foi um dia. Para mim, o encanto dos primeiros filmes estava na tentativa de regastar a figura daqueles velhos heróis dos filmes aventurescos do período entre-guerras (ou mesmo depois). Era uma variação do bom e velho herói romântico, que tem como ícone máximo, no cinema, o ator Humphrey Bogart.
Trata-se do herói de passado obscuro, de espírito ousado, durão, irônico, cético e cínico. Sem contar os corações partidos que ele deixa ao longo do caminho. Mas é claro que, depois, percebemos que esse jeitão meio bruto e desiludido de viver a vida é apenas uma proteção para esconder um homem coração mole, que também tem suas cicatrizes na alma. É por isso que nos apaixonamos por essa personagem.
Um outro ícone do cinema que encarna essa figura é o espião inglês James Bond. É sabido que Steven Spielberg sempre desejou dirigir um filme da série 007. Na impossibilidade, criou, junto com George Lucas, o famoso arqueólogo. É fácil notar as semelhanças entre o Indiana dos dois primeiros filmes e James Bond. Ele é aquele homem durão, egoísta, trapaceiro, amoral e "heart breaker" que adoramos. Uma das cenas mais saborosas de Os caçadores da arca perdida é quando Jones mata um muçulmano que faz malabarismos com um sabre. Para isso, dispara um único tiro. É claro que uma cena dessas nunca apareceria nos filmes recentes de Spielberg (a não ser, é claro, que a personagem seja um vilão!).
A personagem de Harrison Ford, por exemplo, buscava artefatos para satisfação pessoal. Não se preocupava em deixá-los em museus, a ponto de "decorar" sua sala de aula com muitos deles. Ora, isso não cabe no "novo" Indiana Jones! Afinal, um herói tem de ter escrúpulos, não? Em uma cena do novo filme, ele se sente tentado a pegar um objeto histórico, mas o devolve. É sintomático.
Indiana Jones envelheceu. É um senhor bem comportado agora, movido por grandes ideais. Pai amantíssimo. Quer que seu filho estude. Faz declarações de amor. Casa na igreja... Tudo bem família. É o fim da picada! É descaracterizar uma das personalidades mais apaixonantes da história do cinema.
A segunda mudança está no roteiro. Há uma grande diferença entre o primeiro filme, escrito por Lawrence Kasdan e este último, escrito por David Koepp, o mesmo da série Homem-Aranha. O cara é bom, mas aqui escorregou no quiabo. A história não tem pé nem cabeça. Poderia nem ter, se fosse ao menos sedutora. Aí é que está: não seduz. É uma bobagem ao estilo Eram os deuses astronautas, livro escrito em 1968 pelo suíço Erich von Däniken, em o autor especula a possibilidade das antigas civilizações terrestres serem resultados de alienígenas que para cá teriam se deslocado. A idéia poderia até ser interessante se fosse melhor trabalhada, mas é um argumento que não desperta o nosso interesse, a nossa curiosidade.
Outro problema do roteiro é que o filme se perde nas excessivas auto-referências. É algo que percebi ao longo dos filmes da série. Se Caçadores... se levava a sério, aos poucos os filmes seguintes foram descanbando para a autoparódia e para o humor. Isso atinge o ápice nessa última película.
A vilã criada para a aventura, encarnada pela Cate Blanchet, então, nem chega perto dos primeiros vilões da série. E todos sabemos a importância de um bom vilão para fazer uma história funcionar. Ela é apenas uma pedra no caminho do herói para atingir seu objetivo e nada mais. Uma espiã soviética não tem metade do "apelo" de um oficial nazista. Blanchet é uma boa atriz, mas aqui não tem o que acrescentar.
Outra questão é que os filmes iniciais da série eram feitos para um público adulto, saudoso dos velhos heróis e antigas aventuras à la Gunga Din, filme de aventuras dirigido por George Stevens lááááá em 1939 (assistam!). Não sei se me expresso bem, mas filmes desse tipo, apesar de puro divertimento, se levavam a sério. Hoje, os filmes de aventura são feitos para crianças descerebradas. Tratam o público com um bando de imbecis.
Isso não é novidade. A grande crítica de cinema, Pauline Kael, escreveu, há mais de 30 anos, um ensaio em que diz:

As pessoas preferem o óbvio, o aberto, os filmes que não lhes pedem para sentir nada. Se um filme é um sucesso, isso significa sensações garantidas - e sensações sem sentimentos.
E, sobre os roteirista de Hollywood, ela diz logo adiante:

Não pressupõem um espectador ideal - presumem um caipira de olhos vazios, sem alma, ignorante.
Em Indiana Jones e o reino da caveira de cristal, o que importa é o espetáculo digital. É lógico que o computador ajuda, mas, em excesso, torna tudo artificial. Ainda mais quando se sobrepõe à história e ao desenvolvimento das personagens. É o que ocorre, por exemplo, nos três últimos filmes da série Star Wars, a anos-luz de distância da magia da trilogia inicial. Podem me chamar de passadista, mas eram muito mais gostosas as truncagens artesanais.
Enfim, o que posso dizer?
Indiana perdeu a sua alma.