domingo, 27 de dezembro de 2009

Afinal, por que ler nas férias?

IVO BARROSO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Quando minha mulher me viu enfiar o suspeito embrulho na mala do carro, foi logo perguntando: "Que é isto? Não vai dizer que está levando livros para ler nas férias?!"
O espanto era natural: ela não podia admitir que alguém, que passa o ano inteiro metido nos livros, os carregasse para a montanha ou a praia, onde o ideal seria quebrar essa rotina de ler e de escrever.
Explico que a leitura das férias é totalmente diversa da que fazemos por dever de ofício. São férias de leitura essas leituras das férias; nelas saboreamos de novo o prazer de ler sem compromisso, numa boa, por mera distração.

Leitura e lazer
Rodeado de verde ou embaixo de um para-sol, a leitura se torna tão agradável e menos cansativa do que as caminhadas pelo mato e as braçadas na piscina.
Não que uma coisa vá impedir a outra, pois as férias nos permitem saborear esse coquetel de ação e meditação: exercício muscular e repouso mental associados a repouso muscular e exercício mental.
Nas férias, você pode ler aquele livro que seus colegas de trabalho estavam comentando com você por fora.
Se não gosta de best-sellers, está bem, mas, nas férias, não custa ver por que motivo estão falando de vampiros as mesmas pessoas que no ano passado falavam de Harry Potter.
Claro, se você é chegado às letras, aproveite para pegar de novo aquele livro fundamental que você deixou no capítulo 14.
Novidades? É só passar numa livraria que os tentáculos envolventes de centenas de tomos, com suas capas chamativas e títulos provocantes, estarão prontos para te agarrar ou desejosos de serem agarrados.
Nos escaparates (é assim que se diz vitrines em Portugal -aprendi isso num livro), centenas de autores estarão disputando a possibilidade de entrar em férias... com você.
Leve algum, não hesite: haverá sempre um dia de chuva, um churrasco indigesto, uma festa de crianças que lhe permitirão refugiar-se no barato careta da leitura.


IVO BARROSO é poeta e crítico. É autor de "A Caça Virtual" (ed. Record) e tradutor de "Arthur Rimbaud - Correspondência" (Topbooks).

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Cinco acusações contra o ENEM

1. CONFUSÃO entre avaliação e seleção. Criado com a saudável finalidade de avaliar os estudantes e as escolas brasileiras, o Enem agora passou, sem muita cautela, a ser um instrumento de seleção para ingresso na universidade.
São, ou deveriam ser, duas atividades muito distintas, que o Brasil lamentavelmente tem misturado desde o começo dos anos 70, quando houve forte aumento do número de formados no ensino médio demandando as escassas vagas superiores, num processo que constrangeu as universidades a barrar candidatos em massa.
Resultou que o vestibular, exame de seleção para ingresso, gerou um rebote e virou critério informal, mas efetivo, de avaliação das escolas e dos alunos, num curto-circuito perverso, agora reiterado pelo MEC.
2. Reforço à supercentralização. Na pior tradição ultracentralista do Estado brasileiro -que, ao longo dos tempos, suga as províncias e esvazia seu poder, cevando com isso a imensa burocracia sediada na capital-, agora o MEC inventa um exame nacional concentradíssimo. O imbróglio do Enem pouco tempo atrás foi fruto de maldade e inexperiência, mas, mais ainda, dessa supercentralização.
Além disso, o Enem, aplicado no país todo, suprimiu temas que chama de "regionais", o que envolve de revoltas sociais e marcos geográficos a escritores e livros. Segundo qual critério se define o "nacional" ou o "regional" não está claro, mas eu arrisco dizer: será o critério da atual hegemonia cultural, que é paulistocêntrica.
3. Desrespeito pela experiência das universidades. Que o MEC quisesse inventar um exame nacional com papel de seleção seria até respeitável, desde que, pelo menos, fosse levada em conta a vasta experiência acumulada nas melhores universidades brasileiras. Ao longo de quase 40 anos, foram elaboradas provas de seleção que representaram incontável avanço, em todas as áreas. As universidades operaram dentro de regras relativamente duras, e o fizeram com grande competência. Por que bom motivo o MEC não considerou essa riqueza acumulada? Nem falemos do processo de atribuição de notas para a redação, que vai ser feito sem a necessária unidade de operação, cada avaliador em sua casa, em outro desrespeito a uma larga e competente tradição das boas universidades brasileiras.
4. Autoritarismo. O MEC induziu as universidades a aceitarem o Enem como vestibular, com uma pequena margem de manobra (margem que foi aproveitada, não por acaso, pelas mais competentes universidades, que, enquanto não forem constrangidas economicamente, vão resistir a ele, espero). O prazo desse processo, considerando a correta lentidão que uma universidade precisa manter, foi estreitíssimo. E a mudança foi divulgada, como se viu em Porto Alegre, com ares de verdade revelada: quadros do MEC vieram à boca da cena, com aquele sorriso desdenhoso de quem tem pouca leitura e muito poder, para regozijar-se com a suposta modernização que anunciavam. Durante a ditadura, é bom lembrar, também se viu isso: a toque de caixa, sem debate público e embalado por um discurso modernizador, o governo federal impôs aquela mixórdia legal que alterou para pior o ensino fundamental e o médio. Um paralelo assustador: àquela época, o MEC quis abolir o ensino de português e literatura, obrigando à medonha "comunicação e expressão"; agora, o MEC nomeia a prova que trata dos mesmos conteúdos com outro horror: "linguagens, códigos e suas tecnologias". Autoritarismo pouco culto, de quem presume estar reinventando o mundo, aliado a redação inepta, em mais um assalto da luta da pedagogia inespecífica contra os "conteúdos" que ela tanto despreza -e ai de quem tenha estudado e valorize algum deles.
5. Desprezo pela história da literatura. O modo de elaborar a prova, na tal área de linguagens, códigos e, argh, suas tecnologias, jogou no lixo a grande tradição de ensino de história da literatura. Há defeitos nela? Por certo que sim, e está aqui um dos tantos críticos dos modelos atuais; mas provavelmente serão proporcionais aos de qualquer outra área. O certo é que o Enem trata o texto literário como apenas um texto entre outros, um poema de Drummond no mesmo patamar que um anúncio de remédio e um cartaz contra o cigarro, sem nenhum contexto. As aulas de história da literatura costumam ser a melhor (quando não a única) porta de entrada oferecida pela escola ao mundo da cultura letrada; abolida do programa do Enem a demanda por essa dimensão, e na assustadora hipótese de o exame vir a ser o vestibular universal para o terceiro grau, o que ocorrerá?
A morte por asfixia da história da literatura parece quase inevitável, e com ela a citada porta de entrada. Isso num governo de esquerda, que costuma alegar gosto pela história.


LUÍS AUGUSTO FISCHER , 51, é professor de literatura brasileira na UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) e escritor, autor de "Inteligência com Dor" (Arquipélago), entre outros livros.

Folha de S. Paulo, 10/12/2009.

domingo, 6 de dezembro de 2009

Para além d' "O Menino Maluquinho"

Blog do Ziraldo

    Ótimo para os mais jovens descobrirem porque ele é considerado um dos maiores cartunistas e chargistas do país.

(E olha que a charge é de 1984! )

Cultura não cheira bem

    Bem pertinente o texto de Jorge Coli, publicado hoje (6/12) na Folha. Para ele, o homem sofisticado culturalmente inspira desconfiança. Prova disso está no lugar que lhe reserva a cultura pop. Sempre no papel do psicopata, do desajustado, do misantropo arrogante.

Se alguém é culto, é porque há algo de errado com ele: alguma perversão sórdida, algum impulso assassino, alguma crueldade deve se aninhar, secreta, nessa alma. Cultura não cheira bem.
 (...)
Por vezes, certos retratos revelam que a cultura corrompe a pureza da alma, a energia espontânea. Sintoma de deliquescência, de decadência, de enfraquecimento, ela surgiria onde há falta de energia, de vitalidade, de virilidade.
Muita gente, por sinal, teme a cultura para seus filhos homens. Menino deve jogar futebol, e não ficar lendo livro, ouvindo ópera, indo ver exposição de pintura. É mau sinal. Quantos pais aceitam tranquilamente a vontade de um garoto de estudar balé -forma cultural particularmente crivada pelos preconceitos sexuais?
Cultura, coisa de pessoas privilegiadas, traz ainda uma inevitável marca de classe. Isso se espelha na oposição, que tantos proclamam, entre "cultura das elites" e "cultura popular", com desprezo por uma e valorização da outra.
Cultura é ainda desdenhada quando se suspeita nela o crime da erudição, mal-entendido como acúmulo estéril de conhecimento "não crítico". No entanto, qualquer um que tenha descoberto Picasso, Beethoven ou Dostoiévski sabe que as experiências oferecidas pela cultura modificam o espírito e que o melhoram. Percebe que sensibilidade, refinamento, estudo, saber e prazer imbricam-se nela.

    Hoje, vejo pais de alunos meus que se recusam a comprar livros a seus filhos. Para quê? É dinheiro perdido. Uma vez comprado, ele repousará depois de lido (se lido!) numa estante qualquer e não terá mais nenhuma utilidade. É o que dizem.

Dica: "o livreiro"



Descobri uma espécie de Orkut para quem ama ler.
Acho que é patrocinado pela livraria Cultura.
Dá para pesquisar livros, associar-se a comunidades literárias; emitir opiniões sobre as obras; fazer lista de livros que leu, lerá, quer emprestar ou ganhar. Além disso, há um blog e um clube do livro supervisionado pelo Milton Hatoum.
Para acessá-lo, basta clicar no título acima.
Fica a dica!

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Para quem gosta de ler


A vírgula


 Vírgula pode ser uma pausa... ou não.
 Não, espere.
 Não espere.
 
 Ela pode sumir com seu dinheiro.
 23,4.
 2,34.
 
 Pode criar heróis..
 Isso só, ele resolve.
 Isso só ele resolve.

 Ela pode ser a solução.
 Vamos perder, nada foi resolvido.
 Vamos perder nada, foi resolvido.
 
 A vírgula muda uma opinião.
 Não queremos saber.
 Não, queremos saber.
 
 A vírgula pode condenar ou salvar. 
 Não tenha clemência!
 Não, tenha clemência!
 
 Uma vírgula muda tudo.
 

 Detalhes Adicionais:
 
 SE O HOMEM SOUBESSE O VALOR QUE TEM A MULHER ANDARIA DE QUATRO À SUA PROCURA.
 
 
* Se você for mulher, certamente colocou a vírgula depois de MULHER...

 * Se você for homem, colocou a vírgula depois de TEM...