sábado, 10 de julho de 2010

Futebol


Há uma relação iniludível entre a religião e o desporto designado espetáculo desportivo. É que tanto a religião como o espetáculo desportivo não cessam de criar deuses. Não surpreende, por isso, que o futebol haja tomado o lugar da religião e tornou-se, hoje, um espaço que “religa” as pessoas por meio de novas crenças e de novos deuses. Pelé, Garrincha, Maradona, Cruyff, Eusébio, Platini, Zidane, Cristiano Ronaldo, Kaká, Figo, Leonel Messi etc. são os novos deuses de uma sociedade em que “Deus morreu”.
O segredo do sucesso do futebol reside no fato de, nele, não se usarem as mãos e bem pouco a linguagem e, sem as mãos e a linguagem, diminui a consciência, o espírito crítico e libertam-se os instintos mais primitivos. Qualquer exemplo acabado do senso comum discute futebol, julgando-se sábio, nessa matéria. É que, para falar de futebol, ninguém precisa pensar muito. Sem as mãos e a linguagem, o futebolista não ultrapassa níveis muito baixos de consciência.
A sua vida profissional é uma verdadeira exaltação dos sentidos. Como escreve Álvaro Magalhães, no seu livro História Natural do Futebol: “[...] o jogador de futebol, privado de consciência e carregado de instinto, ganha acesso à intensidade da vida pré-humana e experimenta a matéria de que éramos feitos, antes de sermos o animal evoluído que hoje somos”.

*SERGIO, Manuel. Futebol e religião. O Estado de S. Paulo.

*Filósofo português, é autor de 37 livros, entre eles o recente Filosofia do Futebol.

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