domingo, 18 de julho de 2010

Elogio da Ignorância

O jornal Folha de S. Paulo publicou, neste domingo (18/7), algumas notícias que reforçam uma ideia que sempre tive a respeito do ensino no país. Todos os anos nós professores participamos de reuniões inúteis sobre como melhorar a situação dos colégios e fazer os alunos estudar. Discutem-se modos de avaliação, novas tecnologias, distribuição de notas e metodologias de ensino. Trata-se de cortina de fumaça que disfarça o essencial: é preciso premiar o bons e punir os maus alunos. Será tão difícil colocar isso em ação?

"O país não gosta de premiar os melhores e penalizar os piores"

Nathan Berkovits, 49, professor do Instituto de Física Teórica da Unesp, acha que um clima de mais competição entre os pós-graduandos faria bem para o país.
"O aluno americano sabe que vai ter de ser o melhor para conseguir emprego. Há muita pressão sobre ele, mas ele valoriza o estudo, se esforça", diz. "Não que todos os alunos brasileiros sejam relaxados, os melhores daqui são iguais aos melhores de lá. Mas, na maioria dos casos, a atitude é diferente."
Segundo ele, a prática de "premiar os melhores e penalizar os piores", que no Brasil ganhou o apelido de meritocracia, faria bem ao país.
"Entre todos os professores das federais, os salários são iguais, as horas-aula iguais. Não há uma maneira para diferenciar um pesquisador bom de um ruim."
Mesmo prezando essa tradição americana - foi aluno em Harvard, e nas universidades da Califórnia e de Chicago - Berkovitz acabou deixando os EUA. Ainda em sua terra natal, casou-se com uma brasileira. Veio conhecer o país, gostou e ficou, mesmo depois de divorciado.
"Brasileiro trata estrangeiro até melhor do que trata o próprio brasileiro", diz. Isso talvez seja fruto de uma síndrome de inferioridade, apesar de ter impressão que isso está mudando, diz o físico, que chegou ao em 1994. Naturalizado desde 2002, não se considera mais americano.
"O brasileiro acha estranho um estrangeiro querer morar aqui. Mas é um lugar bom para morar se você não é pobre, apesar da violência."
O físico se incomoda com o frio de São Paulo. "As casas aqui são construídas para o calor. Nos EUA você não sente frio dentro de casa."
Há onze anos, se casou com outra brasileira. Não pensa, por enquanto, em voltar. "Aqui não existe tanta pressão para fazer o que todo mundo está fazendo. Além disso, algumas coisas melhoraram muito, como o CNPq."
Ele acha que o Brasil não sabe atrair bons cientistas de fora - processos de contratação em português ainda atrapalham numa área onde o inglês já é língua franca.

"Quem gosta de estudar não é admirado no Brasil"

Guo Qiang Hai, 48, físico chinês que mora em São Carlos (SP) desde 1993, veio para o Brasil sem conhecer ninguém, atrás de uma bolsa na Universidade Federal de São Carlos. Desde 2003 é professor da USP. Adora o país, mas está preocupado.
Tem uma filha de um ano com uma brasileira e acha que as escolas que ela vai frequentar não são tão boas quanto as chinesas.
"Na China a escola é em tempo integral, o aluno sempre volta com tarefa. Se precisar, ele estuda no sábado."
Para Hai, a escola chinesa não é melhor apenas que a brasileira. Ele tem outra filha, que estudava na China até o ano passado. Com dificuldades em matemática, tinha um professor particular.
Quando a menina se mudou com a mãe (também chinesa) para a Austrália, se tornou a melhor da turma na matéria. "Todos falam para ela "nossa, como você é inteligente'", conta Hai, rindo.
"Além de o professor chinês ganhar bem, os alunos respeitam. Existe uma cultura que valoriza o conhecimento. Aqui não é bem assim. Na TV, parece que só se admira quem participou do Big Brother, tem dinheiro, é modelo. A sociedade não põe na cabeça das crianças que elas têm de estudar."
Isso se reflete na qualidade da pesquisa brasileira, diz Hai. Ainda assim, ele diz que a valorização da ciência tem melhorado: "Em São Paulo, não falta financiamento".
Para o pesquisador é estranho sofrer pouca cobrança. "O docente aqui é funcionário público, não tem tanta pressão como nos EUA ou na China. Aqui existem muitos que se dedicam dia e noite, mas quem não faz nada continua na universidade."
Existem problemas, mas é preciso ressaltar as qualidades do país, diz. "As pessoas são legais, é fácil fazer amizade. Eu gosto muito, gosto do clima. Só português eu achei meio complicado", brinca.
Hai acompanha com otimismo as notícias de seu país. "Quando saí da China para a Europa, em 1988, ela era bem fechada. Hoje mudou muito. Ainda não existem jornais particulares, a TV é estatal. Mas você pode falar com os seus amigos o que quiser. Não é que nem a gente vê na televisão aqui."
Diz se impressionar com o crescimento econômico chinês. "Todo mundo está querendo ficar rico. Deus é grana", brinca. "Se você tem dinheiro, faz o que quiser."

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